A 2ª Turma Ordinária da 1ª Câmara da 1ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu, por maioria de votos (5×1), que é válida a dedução extemporânea de Juros sobre Capital Próprio (JCP) na apuração do IRPJ e da CSLL, ainda que o pagamento ocorra após o exercício em que o lucro foi gerado.
A decisão reforça que o fato gerador da despesa dedutível é a deliberação societária, e não o exercício contábil do lucro, ampliando a segurança jurídica para empresas que deliberam o JCP em exercícios posteriores.
Detalhes do caso
Contribuinte: Citibank Leasing S.A. – Arrendamento Mercantil
Períodos de apuração do JCP: 2010, 2011 e 2012
Anos de dedução no IRPJ/CSLL: 2013 e 2014 (deduções extemporâneas)
Processo: Acórdão nº 1101-006.275, julgado em 23/10/2025
Relator: Conselheiro Luís Fabiano Alves de Souza (representante da Fazenda)
Voto vencedor: Conselheiro Rodrigo da Costa Pôssas (representante dos contribuintes)
Entendimento da Receita Federal (voto vencido)
A Receita Federal autuou a empresa sob a alegação de que o JCP só pode ser deduzido no exercício em que o lucro é apurado, conforme o art. 9º da Lei nº 9.249/1995, sob pena de perda do benefício fiscal.
Segundo o órgão, a dedução posterior configuraria planejamento tributário abusivo e violaria o regime de competência contábil, já que a despesa deveria ter sido reconhecida no exercício original.
Decisão do CARF (voto vencedor – 5×1)
A Turma rejeitou a autuação, com base nos seguintes fundamentos:
| Ponto central | Fundamentação do CARF |
|---|---|
| Momento do fato gerador da despesa | O JCP somente se torna uma obrigação quando há deliberação societária, conforme o art. 201, §1º, da Lei nº 6.404/1976. Antes disso, não há despesa reconhecível. |
| Regime de competência | A dedução segue o princípio da competência contábil — o registro deve ocorrer no exercício da deliberação, independentemente do ano-base do lucro. |
| Limite legal de dedutibilidade | O limite da TJLP (art. 9º, §1º, da Lei nº 9.249/95) é observado no momento da apuração do JCP, e não na dedução. O pagamento posterior não viola a norma. |
| Precedentes favoráveis | Acórdãos anteriores como 9101-006.275, 9101-005.841 e 9101-004.912 já admitiam a dedução extemporânea quando comprovada a deliberação válida. |
O Conselheiro Rodrigo Pôssas, em seu voto vencedor, afirmou:
“Não há despesa antes da deliberação societária. O JCP não é uma obrigação automática, mas condicionada à aprovação dos sócios. Assim, a dedução no IRPJ/CSLL ocorre legitimamente no exercício do reconhecimento do passivo.”
Implicações práticas para as empresas
Benefícios e oportunidades
- Permite deduzir JCP pagos com atraso, desde que haja deliberação formal em ata e registro contábil no exercício da decisão.
- Possibilita recuperar créditos tributários via declarações retificadoras, desde que dentro do prazo decadencial de cinco anos.
- Favorece o planejamento societário em fusões, cisões e reestruturações que envolvam lucros acumulados.
Condições para aplicação segura
- Existência de ATA de deliberação válida.
- Balanço de referência e demonstrativo da TJLP correspondentes.
- Registro contábil no exercício em que o JCP é efetivamente deliberado.
Riscos residuais
A Receita Federal ainda mantém o entendimento restritivo na Solução de Consulta COSIT nº 75/2020, segundo a qual o JCP é dedutível apenas no exercício de apuração. Embora o CARF não esteja vinculado a essa orientação, a autuação pode ocorrer em casos sem documentação robusta.
A RFB também pode recorrer à Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) para reverter o precedente.
Conclusão
A decisão do CARF consolida o entendimento de que a dedução extemporânea de JCP é legítima, desde que haja deliberação societária válida e documentação contábil adequada.
O julgamento representa um avanço na segurança jurídica e uma oportunidade de revisão fiscal para empresas que não deduziram o JCP em exercícios anteriores por cautela ou atraso na deliberação societária.
Empresas com lucros acumulados devem avaliar suas atas, balanços e registros contábeis para identificar possibilidades de dedução retroativa de JCP — especialmente em grupos com reorganizações recentes.





